O Irã realizou pela primeira vez na sua história um ataque contra Israel diretamente a partir do seu território.
Para iranianos, o ato foi considerado importante para que a Guarda Revolucionária da República Islâmica do Irã mantivesse a sua credibilidade junto dos seus aliados na região e seus simpatizantes internos. O seu objetivo era demonstrar a disposição do Irã para o confronto e a capacidade dos seus mísseis e drones.
A Guarda Revolucionária foi criada há 45 anos para defender o sistema islâmico do país e servir de contrapeso às forças armadas normais. Desde então, ela se tornou uma importante força militar, política e econômica dentro do país e na região.
Após o ataque de sábado (13/4) à noite, muitos apoiadores da República Islâmica do Irã saíram às ruas de Teerã para comemorar. Muitos traziam símbolos palestinos.
“Acho que foi a decisão certa atacar Israel para evitar novos assassinatos de comandantes iranianos na Síria e em outros lugares”, disse uma mulher com cerca de 20 anos, que apoia o governo do Irã, em mensagem de voz enviada à BBC Persian — serviço de notícias da BBC em farsi.
No entanto, muitos críticos afirmam que o regime não representa necessariamente as opiniões de toda a população iraniana.
“Não somos a República Islâmica, somos o verdadeiro Irã. Os próprios iranianos estão em guerra com o regime atual. Não guardamos rancor de nenhuma nação, incluindo Israel”, disse um homem de 40 anos em mensagem de voz enviada para a BBC Persian.
Outra mulher na casa dos 50 anos se disse preocupada com a possibilidade de o ataque desencadear uma guerra regional do Irã contra Israel e seus aliados ocidentais.
Este sentimento se refletiu em uma nova queda na cotação da moeda iraniana contra o dólar americano.
Filas e pânico no Irã
Os iranianos agora temem retaliação de Israel e dos seus aliados após o ataque do fim de semana. Houve pânico entre iranianos, com cidadãos correndo para estocar alimentos e combustível.
Longas filas se formaram em postos de gasolina em Teerã e em outras grandes cidades. Os supermercados ficaram lotados.
Embora Israel afirme ter interceptado com sucesso 99% dos 300 mísseis e drones lançados contra o seu território, as autoridades iranianas celebraram o ataque como um sucesso, destacando o seu impacto simbólico, independentemente das vítimas reais causadas.
O chefe do Estado-Maior iraniano, major-general Mohammad Bagheri, afirmou que entre os alvos dentro de Israel estava a base aérea israelense de Notam, de onde voaram os aviões F35 israelenses que causaram a morte de 7 comandantes da Guarda revolucionária iraniana há duas semanas no consulado iraniano em Damasco.
Ele também garantiu que o Irã alcançou o seu objetivo e não tem intenção de continuar as operações. O presidente iraniano, Ebrahim Raisi, advertiu, no entanto, que qualquer novo ataque provocaria uma resposta muito mais forte do Irã.
Aparentemente, militares e autoridades governamentais estão satisfeitos com o ataque de sábado, e o clima no Irã agora é de redução das tensões.
“O Irã nunca pretende contribuir para as repercussões do conflito na região, nem para escalar ou prolongar a tensão”, disse no domingo (14/4) o embaixador do Irã na ONU em uma sessão de emergência do Conselho de Segurança.
E há uma leitura de que o Irã, ao dar a Israel tempo suficiente para montar as suas medidas defensivas, não tinha intenção de causar maiores danos ou vítimas.
Crise de legitimidade
Muitos iranianos são contra as intervenções da Guarda Revolucionária Iraniana na região.
Vários iranianos afirmam que os bilhões de dólares gastos na organização, treinamento e armamento de milícias no exterior poderiam ter sido usados no desenvolvimento do país.
A intromissão do Irã na região levou a sanções e ao isolamento, o que prejudicou a economia do país. A inflação está disparando e até a classe média iraniana tem cada vez mais dificuldades econômicas.
As vozes que ouvimos do Irã indicam que o regime não tem apoio da maioria da população, especialmente em caso de guerra.
É um cenário radicalmente diferente daquele observado durante os oito anos de conflito com o Iraque na década de 1980, quando milhões de jovens iranianos defenderam fervorosamente o seu país contra o regime de Saddam Hussein.
Um veterano da guerra Irã-Iraque manifestou sua oposição ao governo e sua dura repressão aos críticos. “Eu nunca mais lutaria por eles”, disse ele.
As políticas do regime mudaram a opinião até dos antigos apoiadores e alteraram significativamente o cenário político.
O Irã tem capacidade de lançar uma combinação poderosa de ataques com mísseis e drones, reforçada pelo forte apoio das milícias xiitas no Líbano, Síria e Iraque, bem como dos Houthis no Iêmen. Mas parece que o ataque foi projetado para causar o mínimo de baixas a Israel.
Em tempos de guerra, a República Islâmica do Irã não está apenas preocupada com a capacidade militar de Israel e do seu aliado, os Estados Unidos, mas também com uma possível agitação interna.
Os protestos de 2022 após a morte de Mahsa Amini sob custódia policial expuseram a vulnerabilidade do regime.
Muitos líderes da República Islâmica do Irã temem que ataques aos centros de comando e comunicação das forças de segurança iranianas e da Guarda Revolucionária, em caso de uma guerra com Israel e os Estados Unidos, poderia reacender os protestos e animar os opositores do regime.
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