Efeitos do custo no Brasil: Problemas na logística vão afetar alívio na inflação com supersafra

Aguardada pelo governo como uma das formas de aliviar o preço dos alimentos, a supersafra de grãos, estimada em 325,7 milhões de toneladas, esbarra no gargalo logístico. Produtores disputam caminhões para escoar rapidamente os produtos e, como consequência, há uma disparada no preço do frete.

Em Mato Grosso, maior estado produtor de soja — com uma previsão de safra de 165 milhões de toneladas —, o preço do frete subiu 62% entre janeiro e fevereiro. De Água Boa (MT) até o Porto de Santos (SP), o custo subiu 69,3% no período, por exemplo, alta que se repetiu em outras localidades do estado. Os números são da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da Universidade de São Paulo (USP).

Impacto no preço

Esse cenário ocorre em todo o país, segundo o monitoramento. O valor médio nacional do transporte de grãos aumentou 34,6% entre janeiro e fevereiro. Em relação ao mesmo período do ano passado, a alta foi de 19,3%. O índice considera grandes corredores de exportação de diversos estados produtores. O aumento no custo do transporte tende a se disseminar em todos os setores da economia e afetar o preço dos alimentos, no momento em que o governo busca saídas para conter a alta dos itens alimentícios, considerada um dos fatores que afetaram a popularidade do presidente.

Como a janela de plantio da safra ficou estreita devido ao clima, a colheita recorde acontece de forma concentrada. Isso represou o escoamento da produção, afirmou o coordenador do grupo de pesquisa da Esalq, Thiago Pera. Segundo ele, 2025 será ainda mais desafiador para o agronegócio devido, principalmente, a dois fatores: o crescimento da safra, que eleva a demanda por transporte; e o aumento do preço do diesel. Há um ano, o litro do diesel custava, em média, R$ 6, e hoje está em R$ 6,46.

— Estamos vivendo uma escalada no preço do frete, com reflexos no bolso do consumidor devido à correlação do custo com outros setores da economia, bens e serviços, além dos alimentos — disse Pera.

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Ele alertou que a situação deve se repetir em julho, quando está prevista a safra de milho. No ritmo apressado da lavoura neste ano, as máquinas que plantam milho vieram logo atrás das colheitadeiras de soja.

Outro fator que está impactando os custos é, segundo a Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA), um deslocamento de caminhoneiros para estados do Centro-Oeste, em busca de maior remuneração. Dessa forma, faltam veículos para escoar a produção de outras fronteiras agrícolas, como Bahia, Goiás, Minas Gerais e Mato Grosso do Sul, afirmou a consultora da CNA, Elisângela Pereira Lopes.

Ela destacou que na Bahia, por exemplo, há grande produção de algodão, além de o estado concentrar indústrias esmagadoras de grãos. De uma frota atual de 2,252 milhões de caminhões, a frota dedicada ao transporte de grãos é de 1,7 milhão, segundo dados da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).

— A questão não é apenas a frota em si. Os caminhoneiros se deslocam para atender à demanda mais vantajosa, e isso faz o frete aumentar — explicou Elisângela.

Há cerca de uma semana, a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) enfrentou problemas para transportar uma carga de milho entre o Piauí e a Paraíba. Uma das empresas vencedoras do leilão não conseguiu caminhões disponíveis. Outras quatro tiveram de pedir mais tempo para executar o contrato e foram atendidas, segundo a Conab.

Falta de armazéns

Na lista de entraves logísticos para a safra, estão ainda a escassez de mão de obra e a falta de armazéns. No primeiro caso, o engenheiro de transporte Lauro Valdivia, assessor técnico da NTC&Logística — parceira da Confederação Nacional do Transporte (CNT) —, calcula que 93% das empresas associadas relataram dificuldades para contratar caminhoneiros e mão de obra. A pesquisa foi realizada em janeiro com 400 empresários de todo o país.

— Os problemas enfrentados pela safra são recorrentes, mas se agravaram neste momento de pico — disse Valdivia.

Segundo a CNA, a falta de armazéns impede o produtor de guardar os grãos à espera de uma melhor oportunidade de escoamento. Do volume total da safra a ser colhida este ano, 115,6 milhões de toneladas não têm armazenagem adequada, sendo 46 milhões de toneladas só em Mato Grosso.

Do total de armazéns disponíveis no país, apenas 16,8% pertencem a fazendas. Quem não dispõe esse tipo de espaço precisa alugar ou despachar o produto até o porto rapidamente, explicou a assessora técnica da CNA:

— Se tivéssemos que armazenar toda a produção de grãos de uma só vez, só teríamos 64% de capacidade. Mas, em alguns estados, como Mato Grosso, só seria possível armazenar metade dos grãos. Por isso, o custo de armazenagem aumenta nos momentos de pico da safra, que precisa ser escoada por caminhões.

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